Fim do Cambio Manual, fim do prazer de dirigir ?

Uma boa conversa com os amigos pode render muita coisa, uma boa conversa com os amigos sobre carros pode render demais, um grande debate até. Mas quando se discute sobre carros, sempre se chega ao tema carros automáticos ou manuais, quem tem carro automático fala do consumo um pouco elevado em tom reclamação(ou não) e comodidade de não ter mudar de marcha, e quem tem carro manual se refere a este com um símbolo de robustez ou prazer de dirigir. Ambos estão certos. Não precisa ser muito perspicaz para notar o quanto o cambio automático e o seu irmão, o automatizado, aumentaram dramaticamente dentro das concessionárias e revendas de seminovos.
Será então o fim do cambio manual ? Não, não ainda. Este ainda vai permanecer por um bom tempo em versões populares ou menos equipadas de carros intermediários, contudo é possível perceber o quão este item se tornou valorizado e sua ausência em determinados modelos um verdadeiro mico. Veja agora o que estes sistemas tem de particularidades e quais são os fatores que, aos poucos, vão tirando o bom e velho cambio com pedal de embreagem da jogada.

Particularidade dos Cambios Automático e Automatizado

O cambio automatizado ou robotizado é uma alternativa semelhante ao automático em termos de funcionamento, mas que difere muito do segundo mecanicamente. O automatizado pode utilizar a mesma caixa de marcha de um cambio manual e ainda ter sistema de embreagem dupla, com um sistema eletro hidráulico que faz a função de embrear e debrear exercida anteriormente pelo seu pé esquerdo e claro, de trocar de marcha. Possui trocas automáticas ou manuais sequenciais, além de disponibilizar a tecla S para trocas mais rápidas e em regimes de funcionamento mais elevados. Com isso tudo, o automatizado realiza com certa competência as funções de um automático a um custo acessível, tanto que é utilizado em versões mais equipadas de carros populares como Gol e Palio. O tradicional cambio automático, com conversor de torque, é o que há de melhor em conforto, trocas suaves e quase imperceptíveis são seus trunfos. Você pode até já ter escutado mitos como “carros automáticos são mais propensos a quebra ou defeitos”, mas a verdade e que estes são tão robustos quanto um bom manual, no entanto o cambio automático precisa de atenção nas manutenções preventivas, algo que em nossa cultura é deixado de lado, e então as quebras acontecem. É verdade que veículos automáticos possuem o consumo de combustível em ciclo urbano mais elevado, em virtude do seu princípio de funcionamento. Este acaba sendo seu ponto fraco, mas o sistema da a volta por cima com melhores de números de consumo no ciclo rodoviário, e a este se deve ao fato do grande escalonamento das marchas, que visando sempre conforto ao rodar, são um pouco mais longas e proporcionam, em velocidade de cruzeiro, um rodar com baixo giro do motor, e então baixo consumo.

Quais fatores diminuem o número de veículos com cambio manual ?

Crédito foto: Zf

Por que marcas como Ferrari e Lamborghini deixaram de utilizar transmissão manual em troca de sistemas automatizados ou automáticos? Pedal de embreagem, alavanca de cambio com a clássica grelha certamente serão dados como itens históricos nos próximos anos. Mercedes Bens e BMW estão bem avançadas nisso. Lamborghini já tirou de linha o Galhardo, o seu ultimo modelo com opção de cambio manual, a Ferrari o tinha com a California de 2012 e hoje não mais, a Porsche além de ter criado o conhecido Tiptronic, hoje trabalha pesado no desenvolvimento do bem sucedido PDK. Respondendo a pergunta acima, sim as marcas estão deixando de lado o cambio manual em prol de sistemas automáticos e automatizados. Embora essas marcas façam carros objetivando o maior prazer de uma condução possível, elas também pensam na combinação de performance e conveniência. Pensar em performance é ter um cambio com uma troca praticamente imediata (60ms) e conveniência é poder utilizar o veículo mais tranquilamente sem ter que cuidar de um pedal de embreagem duro e uma alavanca pesada para se gerenciar. No entanto, é fato que estes sistemas são mais caros para serem desenvolvidos e fabricados, mas são muito mais eficientes em aguentar a potência dos novos motores, serem leves e ainda estarem em plena comunicação com os sistemas de injeção eletrônica, controles de estabilidade e tração, freio ABS e etc. Imagina projetar um cambio manual robusto o suficiente para segurar a força de um motor de 500cv(potência que já não é considerada das mais altas hoje em dia)?  Como seria a condução “em modo tranquilo” desse veículo ? Este cambio certamente teria que ter um conjunto muito robusto, o que muitas vezes pode resultar em mais peso, maior custo e não é raro encontrar sistemas automáticos ou automatizados mais leves que um sistema manual. Trazendo para a realidade do nosso cotidiano, até o fim dos anos 90 o cambio automático era tido como problemático e de difícil manutenção. Ao redor disso criou-se diversos mitos, contudo o número de veículos com essa configuração só aumentou e forçou os reparadores de oficinas particulares procurarem cursos de técnicos especializados, logo o cambio automático deixou de ser um item de difícil manutenção para ser algo normal, e assim o cliente dono de um veículo automático passou a ter um leque maior de opções para manutenção do veículo fora da concessionária. Um curso técnico de cambio automático custa em torno de R$ 800,00 a R$1000,00.

E o prazer de dirigir ainda vai existir ?

Crédito foto: Mercedes-Benz

Em tempos de grandes congestionamentos qual o prazer que se tem em dirigir um carro com cambio manual ? Nenhum. A não ser que você seja a sadomasoquista ao ponto de curtir boas dores no braço direito de tanto ter que passar e reduzir marchas. Aliás o prazer de dirigir é inexistente com tanto congestionamento. Acredite motor potente e cambio manual só pioram as coisas nesses momentos. Isso quer dizer que o prazer de dirigir está se acabando ? Não exatamente, temos exemplos de carros que mesmo com modernos câmbios automáticos conseguem conciliar prazer de dirigir e conforto nas horas determinadas. O que dizer do Fusca, no qual a versão manual não entrega o mesmo nível de diversão que a versão automática com opção de trocas sequenciais ? Além de bom de guiar, as borboletas atrás do volante remetem a mesma configuração dos monopostos de corrida. Um detalhe legal do novo Fusca são os estouros no escapamento nas reduções mais fortes. Mas isso só se consegue na versão com cambio automático, no manual não se consegue obter este pequeno detalhe.

Conclusão

Como nas categorias de topo do automobilismo o uso é praticamente 100% do cambio automatizado, seja ele na alavanca ou com borboletas atrás do volante, as versões de rua trazem consigo o “dna” das pistas, o uso das borboletas atrás do volante torna possível manter as mão nos volante enquanto se troca as marchas, e por outro lado é também mais relaxante em uma condução mais civilizada, o punta-tacco, manobra executada com o pé direito enquanto freia e reduz as marchas para sincronizar os giros do motor, não é mais necessária, pois o próprio sistema eletrônico do veículo encarrega-se de faze-lo. Tudo isso acaba minando o prazer de dirigir, reduz a relação entre o homem e a máquina, mas por outro lado trás consigo carros mais seguros e capazes de garantir que muitos motoristas não entrem em saia justa por abusar de mais do carro, e se entrarem, consigam sair. Ou, para os bons motoristas, representarão melhor performance, menor tempo em track days e aquela sensação de que na hora da verdade existem sensores, atuadores e ECU te dando uma força. Quando muitos perceberem isso, o último Galhardo com cambio manual, a última California manual, Porsche Carrera GT, Civic Si, Golf GTi e todos os esportivos que foram(e são) manuais serão itens históricos, e serão disputados a tapa.