Paixão Por Carros Vence a Dura Realidade

Quando pequeno dizia ao meu pai que ia ser “consertador de carro” e ele me dizia “então você vai ser  Engenheiro Mecânico”. Daí por diante passei a repetir “vou ser engenheiro mercânico” (sim, eu falava mecânico errado.), sempre conta minha mãe. Pobre mancebo, eu nem imaginava que a realidade nas oficinas era bem diferente de preparar carros no Gran Turismo 2.

O ano era 2007 e eu acabava de deixar o colégio para cursar engenharia mecânica em uma faculdade privada; lembro da minha vibração (que durou pouco.) “agora vou estudar o que gosto”. Olhei minha grade curricular e tinha apenas uma cadeira que tinha ou que poderia ter algo haver com carros (motores de combustão interna) e melhor ainda, era perto do fim do curso, que inocência…

Mesmo assim eu não desisti, tinha visto em algum lugar sobre um curso de mecânica automotiva, esse lugar era o CEFET (hoje IFCE), não perdi tempo, fui atrás e me inscrevi para o vestibular, e passei, lembro do dia da segunda prova, pois foi no mesmo domingo da etapa Formula Truck aqui em minha cidade “Agora sim vou estudar sobre carros” vibrei, e então descobri que todos meus esforços para ser um “expert” no assunto tinham sido pífios, pois quando assisti a minha primeira aula, descobri que não sabia de nada, nem manejar as ferramentas e o pior, eu tinha colegas mais novos e mais experientes tanto em prática como em conhecimento, foi dureza.

Conciliar o CEFET e a faculdade foi complicado, mas isso foi por pouco tempo, no final de 2007 eu consegui um estágio como auditor de peças em uma grupo que controla várias concessionárias, então eu tranquei a faculdade e fiquei trabalhando e estudando Manutenção Automotiva (esse era o nome do curso.) no CEFET. Esqueci festas, baladas e “azaração”, me concentrei nos carros, ou seja, nos estudos.

Até que em 2008 perto do carnaval eu consegui uma vaga de estoquista no setor de peças em uma concessionária Renault da empresa em que eu trabalhava. Vesti a camisa da Renault, me esforcei 100% em prol daquele estoque, e logo fui reconhecido, mas o que eu queria mesmo era estar no meio dos motores e esse pensamento começou a me atormentar mais e mais, a gota d’água aconteceu quando vi um mecânico (indignado por sinal.) montar o motor V6 do Renault Laguna, porém não foi na Renault que consegui entrar na oficina.

O fim de 2008 chegava e o fim do meu contrato de estágio também, eu não queria mais continuar como estoquista, então espalhei meus currículos por várias concessionárias da cidade, mas nenhum fez efeito. Eu precisava fazer algo. Foi quando resolvi conversar com os meus colegas mais experientes do CEFET, e me falaram de um curso de mecânica no SENAI, eu pensei: “esse eu não fiz”. E mais uma vez eu fui atrás, me inscrevi para a prova (muito fácil por sinal.) e passei. No outro dia eu já estava lá na Renault dizendo que no fim do meu contrato eu iria sair e que não queria renovar.

Em Fevereiro de 2009 começava minhas aulas de mecânica automotiva no SENAI, um curso de um ano no qual eu terminei juntamente com o CEFET.

Em Março de 2009 eu fui contratado como aprendiz de mecânico em uma concessionária Volkswagen, e durante esse período fiz a prova de certificação do ASE Brasil e passei. Minha felicidade era tremenda, pois na minha ignorante cabeça era nas concessionárias que estavam os melhores mecânicos de carros, mais uma vez, que inocência…

Pronto, eu consegui, “estou trabalhando em uma oficina, agora é só aprender” eu pensei, e lá se foi o primeiro mês de oficina e vieram algumas decepções, não com as concessionárias em si, mas sim com meus colegas mecânicos. Não é que as concessionárias nem de longe eram aquilo que eu pensava? Será que não entendiam que necessitavam de mecânicos com ética e conhecimento? Ou será que o importante é bater as metas de faturamento? Fiquei frustrado. Mas minha paixão obsessiva por carros me fez conviver com tudo aquilo. Eu queria era aprender. Passei a me concentrar no meu trabalho, aos poucos eu fui pegando prática, e em serviços preventivos eu já fazia com uma organização melhor que a de muitos mecânicos da oficina. Era incrível como eles se sujavam, e pior, o serviço era muitas vezes mau feito e o carro retornava com o mesmo problema. Eu tratava cada carro como se fosse meu, fazia aquilo com um prazer tremendo e não entendia por que eles não. Por que eles tratavam aquilo apenas como “emprego” para sobreviver e ganhar dinheiro, muitas vezes faltando com a ética? Sentia-me mal quando clientes que não entendiam saiam da oficina satisfeitos, onde na verdade o mecânico nem sempre fazia os serviços programados no orçamento, por se tratar de um carro novo e que ainda não necessitava de certos serviços.

Conviver com isso foi um verdadeiro desafio, por que demorou muito para que eu caísse na real e enxergasse que a realidade das oficinas era diferente daquilo que eu imaginava. Perdi a conta de quantas vezes saía da empresa indignado e desmotivado, mas aos poucos eu fui  ficando mais tranquilo, estava mais concentrado  mesmo não aceitando aquela situação.

Sinto-me um privilegiado, trabalho no que gosto, sinto prazer no que faço, olho para os outros mecânicos e muitos deles não estão bem com o que fazem sempre reclamando de um cliente um pouco mais exigente (Por que escolheram a mecânica?). Acho que nesse ponto eu faço a diferença. Mesmo na época quando era um auxiliar eu tirava duvidas dos clientes, conversava sobre o carro, e acredite, era nítido como eles ficavam mais tranquilos.

Nessa época eu me perguntava, “o que falta para os mecânicos de hoje?” Agora eu já sei a resposta, falta o principal, amor ao que escolheu fazer… Gostar de dirigir, de mexer, de consertar, de acelerar, de ouvir o som do motor nem que seja um tímido VW 1.0 ou um Honda B16A, de ver o conta – giros entrando na zona vermelha… Falta a paixão pelo automóvel.

Como eu disse antes, sinto – me um privilegiado, trabalho no que gosto, estudo o que gosto, sinto prazer no que faço. Existem, mas ainda são poucos os mecânicos com esse pensamento. Aqueles mecânicos (que eu sei que existem.) que trabalham com amor, dedicação e ética, tem o meu respeito e a minha admiração. Assim fazemos a diferença, somos profissionais.